Weekly Note
Fed anuncia corte na taxa de juro de referência
1927 Déjà vu?
Esta semana, a Reserva Federal norte americana (Fed) anunciou um corte de 25 pontos base na sua taxa de juro de referência, para uma banda de 1,75%-2%. Trata-se da segunda descida de taxas de juro levada a cabo este ano pelo banco central americano, invertendo assim o rumo de subidas que teve lugar nos últimos anos. O Presidente da Fed, Jerome Powell, aproveitou a ocasião para reafirmar que o desempenho da economia americana é sólido, apesar de persistirem riscos ao nível geopolítico e da conjuntura internacional.
Tendo em conta os sinais de solidez da economia americana, importa questionar quais as motivações para a inversão do rumo da política monetária da Fed, no sentido da descida das taxas diretoras. Segundo dados do FMI, a economia americana deverá registar um crescimento médio de 2,0% nos próximos três anos, num sinal de robustez, sobretudo quando comparado com os 1,2% e 0,7% projetados para a Alemanha e Japão, respetivamente. Por outro lado, o setor financeiro americano encontra-se bem capitalizado e os indicadores de consumo privado e lucros das empresas também não sugerem abrandamento. O mercado de trabalho nos EUA atravessa um bom momento, com a taxa de desemprego próxima de mínimos históricos. Segundo o FMI, em 2019, a taxa de desemprego americana deverá situar-se nos 3,8%, nível que se deverá manter até 2021. Assim sendo, parece claro que a redução de taxas de juro por parte da Fed não surge como resposta a quaisquer problemas na sua economia doméstica, mas que terá motivações externas.
Nos EUA, o número de pessoas dispostas a abandonar o seu trabalho está em máximos dos últimos 18 anos, demonstrando a sua confiança na capacidade de obter um novo emprego.
De facto, a Fed tem vindo a ser pressionada por diversos governos (incluindo o seu) e entidades supranacionais (FMI, Banco Mundial) para que reduza as suas taxas de juro diretoras, com intenção de inverter os fluxos de capitais internacionais que estão a direcionar-se cada vez mais para os EUA, em fuga das regiões economicamente mais fracas, como a Europa e o Japão. A maior fraqueza económica europeia, aliada à incerteza em redor do sistema do Euro, tem favorecido o influxo de capitais para os EUA, vistos cada vez mais como um porto seguro para o capital. Neste contexto, a Fed parece querer atuar como o banco central do mundo reforçando o papel de moeda de referência do dólar americano.
É nosso entendimento que a atual situação tem um paralelo na intervenção dos bancos centrais de 1927. Na altura, os quatro principais bancos centrais – EUA, Reino Unido, França e Alemanha – reuniram-se em Washington DC para pressionar a Fed a cortar as suas taxas de juro. A intenção era tentar inverter os fluxos de capitais que estavam a dirigir-se para os EUA, na esperança de redirecioná-los novamente para a Europa e assim suportar as moedas do Velho Continente. À semelhança do contexto atual, a Europa atravessava uma crise de dívida, em grande parte decorrente dos custos da 1ª Guerra Mundial. Tal como agora, apesar da economia doméstica americana não justificar o relaxar da política monetária, a Fed cedeu e obrigou todas suas sucursais regionais a fixar em baixa (de 4% para 3,5%) as suas taxas de juro diretoras. Contrariamente ao pretendido, a descida de taxas de juro falhou completamente o seu propósito, uma vez que os investidores a entenderam como uma confirmação de que a Europa atravessava graves problemas. Como tal, assistiu-se à intensificação dos fluxos de capitais para os EUA. O refúgio do capital nos EUA foi de tal forma intenso que veio a provocar uma bolha no imobiliário na Florida, bem como uma forte subida do mercado acionista, que acabou por levar a Fed a subir as taxas de juro de 3,5% em 1927 para 6,0% em 1929. (St Louis Federal Reserve Bulletin, September 1927 – December 1929).
Apesar da descida de taxas de juro levada a cabo pela Fed em 1927, os fluxos de capitais para os EUA intensificaram-se, provocando uma forte subida no mercado acionista.
Tomando como exemplo o episódio histórico dos anos 20 e tendo em conta o visível arrefecimento das principais economias mundiais, com exceção dos EUA, consideramos que a Fed poderá estar a cometer o mesmo erro de 1927 e com isso levar à intensificação dos fluxos de capitais para os EUA, favorecendo os ativos privados não dívida com especial enfoque no mercado acionista. Neste contexto, a Sixty Degrees mantém a sua visão favorável ao investimento em ações americanas e dólares.