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Weekly Note

Impacto da crise Covid-19 no setor bancário europeu

Breve análise dos problemas e respostas das autoridades

Nesta fase, tendo em conta a propagação do vírus e as medidas de confinamento e isolamento social decretadas pela maioria dos governos, já se tornou claro que o impacto da crise Covid-19 sobre a economia europeia será bastante severo. A generalidade das estimativas económicas, para o segundo trimestre na Zona Euro, já admite uma contração da economia na ordem dos dois dígitos, como é o caso dos analistas da Capital Economics que estimam um recuo de 20% anualizado no PIB deste período.

Apesar do nível e da duração desta retração ainda não serem claros, a verdade é que a gravidade da situação, até então, já permite inferir consequências muito negativas para o setor bancário europeu. Inevitavelmente, a crise atual fará com que os bancos se confrontem novamente com uma subida no crédito malparado e com uma redução dos seus níveis de capital. De notar que no relatório da EBA (European Banking Authority), de 8 de janeiro passado e relativo ao 3º trimestre de 2019, os bancos mantinham níveis de capital estáveis (CET1 de 14,4% fully loaded basis) mas já esperavam uma deterioração da qualidade de crédito, em especial nas pequenas e médias empresas e no imobiliário comercial.

No que respeita ao lado dos passivos, a situação poderá ficar mais contida devido à contínua intervenção do BCE, nomeadamente através da disponibilização da linha de empréstimos LTRO (Long Term Refinancing Operations) por um período de 3 anos. De referir que numa das suas ações de resposta à presente crise, o BCE procedeu ao alargamento do colateral que os bancos podem entregar para aceder a este financiamento. No mês de março, os bancos europeus já aumentaram em 34% os seus pedidos de empréstimo nesta linha, para 825 mil milhões de euros. O BCE tem vindo a usar o seu balanço de forma agressiva na tentativa de financiar os bancos de forma barata e ao mesmo tempo suportar os mercados de dívida pública dos países periféricos. Contudo, não existe qualquer garantia de que os bancos queiram aumentar o volume de crédito que concedem à economia real.

No entanto, o lado dos ativos estará mais vulnerável. Se tomarmos como exemplo a recessão nos principais países da Zona Euro, em 2009 (o ano mais agudo da crise financeira global), podemos observar uma relação entre a queda do PIB e o aumento do rácio de crédito malparado (rácio NPL Non Performing Loans), a qual é reforçada se retirarmos Itália e Alemanha da amostra. Tal como se pode observar no gráfico abaixo, tomando como referência o sucedido na última crise, uma contração económica de 5% deveria provocar uma subida de 3 pontos percentuais no rácio de crédito malparado. Assim sendo, tendo em conta as atuais estimativas de retração económica poderemos vir a assistir a um aumento significativo no rácio de crédito malparado dos bancos dos principais países do Euro.

Tomando como referência a crise de 2009, uma contração económica de 20% poderá provocar um disparo de até 12 pontos percentuais no rácio de NPL’s
Fonte: Refinitiv, Capital Economics

De referir que segundo dados da EBA, em junho de 2019, o rácio de NPL’s na Zona Euro era de cerca de 3%, equivalente a aproximadamente 630 mil milhões de euros (comparável com os 1.15 biliões de euros registados em junho de 2015). No mesmo período, o aumento de 10% no volume de crédito concedido, também contribuiu para a melhoria do rácio.

Evolução do rácio de crédito malparado na Zona Euro (NPL Ratio) comparado com a performance do índice europeu de bancos (Euro Stoxx Banks)
Fonte: Bloomberg, EBA e Sixty Degrees

Nesta fase, muitos estados-membros têm vindo a oferecer a concessão de garantias para os empréstimos disponibilizados pelos bancos às empresas. Tal como se pode observar no gráfico abaixo, nalguns países os montantes anunciados têm sido elevados, nomeadamente em Itália e Alemanha. Admite-se que esta medida contribua para evitar, nalguma medida, o aumento significativo no número de falências, no curto prazo. No entanto, a existência destas garantias estatais poderá não significar a total isenção de riscos para os bancos, já que é frequente as garantias não cobrirem a totalidade dos créditos e que existem regras algo exigentes para o seu acesso, ou seja, nem todas as empresas são elegíveis.

Garantias estatais vs estimativas de evolução dos NPL’s
Fonte: Capital Economics

Importa também referir que a resposta dos estados europeus, juntamente com todas as restantes medidas de apoio que estão a ser anunciadas, poderão implicar um aumento significativo do stock de dívida pública de grande parte dos países.

Também no mês passado, o BCE anunciou um conjunto de medidas que visam aliviar temporariamente as exigências nos requisitos de capital impostos aos bancos. Os bancos da Zona Euro poderão operar temporariamente abaixo dos níveis de capital definidos pelo Pillar 2 Guidance, a almofada de conservação de capital e o rácio de cobertura de liquidez. Os bancos poderão ainda utilizar parte dos instrumentos de capital que não são qualificados como Core Tier 1. No entanto, estas medidas, no seu todo, deverão assegurar alívios de capital na ordem de 120 mil milhões de euros, o que corresponde apenas uma fração do aumento estimado no rácio de crédito malparado (tomando a crise de 2008-09 como referência). Ao mesmo tempo, os bancos começaram já a anunciar um conjunto de medidas de preservação de capital que passam pela redução parcial ou total dos seus dividendos e/ou dos seus programas de remunerações variáveis (ou pelo seu pagamento via ações).

Na semana passada, o Eurogrupo chegou finalmente a acordo para um pacote de 540 mil milhões de euros. O programa engloba três componentes de empréstimos:

  • apoio às empresas através do Banco Europeu de Investimentos (BEI) num valor de 200 mil milhões de euros;
  • aos estados-membros através do Mecanismo de Estabilidade Europeia (MEE), onde serão criadas linhas de crédito num total até 240 mil milhões de euros e ao qual cada país pode recorrer até ao máximo de 2% do seu PIB, para financiar “despesas direta e indiretamente ligadas à saúde, cura e prevenção do vírus”; e
  • apoio à proposta da Comissão Europeia para a criação de uma espécie de seguro de desemprego que corresponda às medidas que são necessárias para sustentar o emprego e o rendimento dos trabalhadores (programa SURE) de 100 mil milhões de euros.

Desta forma, sem dúvida que a solução apresentada representará um aumento da dívida pública dos estados-membros. De qualquer forma, o acordo alcançado parece ter ficado aquém do desejado em termos da resposta fiscal pretendida por alguns e pela falta de detalhe sobre a utilização do ESM no suporte à pandemia, deixando bem patentes as divergências que ainda subsistem entre os diferentes países da União. Aliás, isto ficou bem claro ao longo do processo negocial, com os países do Sul a tentaram apelar à implementação de eurobonds mas a encontrarem forte oposição dos seus parceiros a Norte, nomeadamente a Alemanha e a Holanda.

Neste contexto, é necessário salientar que os bancos europeus ainda estão expostos ao risco de crédito dos países da Zona Euro através das carteiras de obrigações soberanas. A maioria destes estados apresentam graves desequilíbrios orçamentais, que se tenderão a agravar com a presente crise. Segundo dados da Comissão Europeia (“The Bank Sovereign Loop and Financial Stability in the Euro Area – working paper 2019), os maiores bancos da Zona Euro sob a alçada da EBA apresentam uma exposição a dívida soberana na ordem de 25%-40% do PIB do seu país de origem. Para já, o BCE tem prolongado a sua política de compras de títulos de governos e, no âmbito da atual crise, anunciou um reforço dessas aquisições no valor de 750 mil milhões de euros. No entanto, levantam-se questões sobre a sustentabilidade futura desta situação e a capacidade/vontade do BCE em continuar a auxiliar os mercados periféricos. Convém relembrar aqui que a interrupção no programa de aquisições do banco central desencadearia uma subida das yields soberanas, colocando em cheque os orçamentos da grande maioria dos estados-membros.

A política de taxas de juro negativas implementada pelo BCE tem prejudicado fortemente a margem e o retorno sobre os capitais próprios dos bancos europeus. Desde finais de 2008, a indústria bancária europeia tem sentido grande dificuldade em melhorar significativamente o nível de rendibilidade do seu capital, atualmente em 5%, em resultado das taxas de juro excecionalmente baixas, do legado de NPL’s por resolver e dos elevados requisitos regulatórios de capital. O surgimento da crise Covid-19 e a consequente deterioração das perspetivas económicas na Europa deverá “exigir” o prolongamento dos atuais níveis de taxas de juro mantendo, por isso, uma forte pressão sobre a rendibilidade do negócio bancário. Outro problema que se tenderá a agudizar com a atual crise prende-se com a situação dos fundos de pensões dos vários bancos, em especial os de beneficio definido, cujas responsabilidades dobraram desde a última crise financeira.

Evolução do rácio Return on Equity (ROE) dos bancos europeus.
Fonte: ECB e Bloomberg

Em suma, nesta fase, parece já inevitável que a crise Covid-19 tenha consequências negativas para o setor bancário, traduzidas num potencial aumento do crédito malparado e numa redução dos níveis de capital. A duração da contração económica estará dependente da capacidade dos estados em controlar a propagação do vírus, da maior ou menor rapidez com que consigam levantar as suas medidas de confinamento social e do tempo necessário para a produção de uma vacina. Quanto maior o prolongamento da situação mais nefastos serão os seus efeitos, quer ao nível das insolvências de empresas quer do agravamento das condições do negócio bancário na Europa.

A solução de uma possível crise bancária europeia será ainda dificultada pelo facto da Europa seguir uma política de bail-in’s para a resolução dos seus bancos em apuros. Na crise de 2008-09, as autoridades norte-americanas optaram pela transferência dos ativos problemáticos dos bancos domésticos para os balanços da Fannie Mae e Freddie Mac, através de um bailout apoiado pelo Estado americano. Neste sentido, a resolução do crédito malparado, na Europa, implicaria uma transferência de dinheiro de contribuintes do Norte Europeu para o Sul, situação que encontra séria oposição a Norte. A ausência de consolidação das dívidas dos diferentes estados-membros numa dívida federal única dificulta assim uma solução de resgate abrangente.

Por tudo isto, ainda mantemos a nossa opção por evitar o investimento no setor bancário europeu mesmo após a queda de mais de 80% registada pelo seu índice, desde junho 2007.

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