Weekly Note
Análise à performance dos Hedge Funds
Principais conclusões do artigo “Hedge fund performance: End of an Era?”
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No passado mês de junho, foi publicado no Financial Analysts Journal um estudo intitulado Hedge Fund Performance: End of an Era? pelos autores Nicolas P.B. Bollen, Juha Joenväärä e Mikko Kauppila. O estudo pretende validar a hipótese que tem vindo a ser avançada pelos media de que a performance relativa dos hedge funds sofreu uma deterioração ao longo da década seguinte à crise financeira global. Tendo em conta o volume de 5 biliões de dólares que ainda se encontra atualmente investido em hedge funds (Barth, Joenvaara, Kauppila e Wermers, 2021), torna-se relevante perceber as implicações de uma underperformance por parte desta classe. Assim sendo, o estudo pretende dar resposta a três questões principais:
- A performance agregada relativa dos hedge funds diminuiu desde 2008 tal como reportado nos media?
- Podem os investidores recorrer ao uso dos modelos desenvolvidos até hoje para selecionar um conjunto de hedge funds que registe outperformance?
- Quais as explicações mais prováveis para a deterioração no desempenho dos hedge funds e quais as implicações para o investimento futuro nesta classe?
Relativamente à questão 1, o gráfico abaixo ilustra os resultados obtidos no estudo para o retorno acumulado de uma carteira constituída por todos os hedge funds disponíveis em cada mês, igualmente ponderados, e para o retorno acumulado de um portfolio 50-50 ações/obrigações.
Tal como se pode observar no Painel A do gráfico acima, a carteira de hedge funds gerou um retorno acumulado de 225%, entre 1997-2007, superando claramente o portfolio 50-50 ações/obrigações que gerou um retorno acumulado de apenas 125%. Porém, o Painel B ilustra uma alteração significativa no período seguinte, de 2008-2016, com as duas séries próximas durante os anos da crise financeira global, mas a apresentar uma clara divergência a partir de meados de 2011, culminando numa performance acumulada de 25% para a carteira de hedge funds versus 70% para o portfolio 50-50 ações/obrigações.
O gráfico abaixo apresenta uma comparação entre o rácio de Sharpe das duas séries e a conclusão acima mantém-se. A carteira de hedge funds apresenta desempenho superior na primeira metade do período, as duas séries assemelham-se durante os anos da crise financeira global e posteriormente, a partir de meados de 2011, o portfolio 50-50 ações/obrigações regista uma outperformance significativa.
A Tabela abaixo mostra um resumo das estatísticas anualizadas calculadas para a base de dados de hedge funds considerada, para o portfolio 50-50 ações/obrigações e para uma carteira balanceada com a seguinte alocação: 20% a todos os hedge funds disponíveis, 30% de alocação ao índice S&P 500 e 50% de alocação ao índice de obrigações VBTIX. A comparação entre um portfolio 50-50 ações/obrigações e a carteira 20/30/50 pretende medir a vantagem que um investidor poderá obter se possuir uma alocação a hedge funds.
No subperíodo 1997-2007, a carteira com 20% de alocação a hedge funds gera retorno médio ligeiramente superior ao do portfolio ações/obrigações (7,9% versus 7,6%) e um desvio padrão significativamente inferior (5,5% versus 7,4%). Assim sendo, a alocação de 20% a hedge funds permite o aumento do rácio de Sharpe de 0,54 para 0,79.
Já entre 2008-2016, a alocação a hedge funds regista um retorno médio de 5,2%, inferior ao retorno de 6,3% do portfolio ações/obrigações. Embora a alocação a hedge funds também provoque uma diminuição na volatilidade (de 7,9% para 6,4%), a queda significativa no retorno faz com que o rácio de Sharpe permaneça praticamente inalterado.
Em suma e respondendo à questão 1, o estudo conclui que de facto o desempenho relativo dos hedge funds diminuiu de forma considerável na segunda década em estudo.
No que toca à segunda questão, os autores procuraram investigar se o recurso a modelos de seleção de hedge funds lhes permitiria obter a tão desejada outperformance. A ser verdade, os investidores poderiam continuar a beneficiar de uma alocação a hedge funds, mesmo que se deparem com uma deterioração no desempenho geral da classe como um todo.
Mais uma vez, a análise foi realizada através da comparação entre um portfolio 50-50 ações/obrigações e uma carteira constituída da seguinte forma: 20% hedge funds, 30% S&P 500 e 50% índice de obrigações VBTIX. Tal como se pode observar na tabela abaixo, a alocação de 20% a hedge funds é agora realizada com base em vários modelos que selecionam anualmente os melhores fundos segundo alguns critérios. A tabela mostra os diferenciais de performance entre a carteira com alocação de 20% a hedge funds e o portfolio 50-50 ações/obrigações.
Como se pode observar acima, entre 1997-2016, a alocação a hedge funds selecionados por modelos reduz o retorno médio, mas provoca uma diminuição ainda mais significativa ao nível do desvio padrão. Em geral, a alocação a hedge funds melhora o rácio de Sharpe, embora de forma modesta. Os modelos FH alfa e Macro timing são aqueles que permitem uma melhoria de rácio de Sharpe mais significativa, de 0,13 em ambos os casos. O resultado obtido parece assim indiciar que a utilização de alguns modelos para selecionar hedge funds poderá melhorar a posição do investidor.
Tendo em conta que a deterioração do desempenho relativo dos hedge funds foi verificada a partir de 2008, importa repetir a análise acima para o período pós-crise financeira. Nesse sentido, a tabela abaixo ilustra os resultados obtidos nos dois subperíodos de 1997-2007 e 2008-2016.
Entre 1997-2007, o investimento em hedge funds com base em modelos permitiu a melhoria significativa dos rácios de Sharpe face a um portfolio 50-50 ações/obrigações, devido à redução substancial no desvio padrão.
No Painel B da tabela acima, verifica-se que entre 2008-2016 a alocação a hedge funds também permitiu reduzir o desvio padrão de forma significativa, no entanto, a redução substancial dos retornos médios durante este período acabou por compensar ou anular o benefício da menor volatilidade, o que se traduziu numa subida insignificante ao nível dos rácios de Sharpe.
Assim sendo, conclui-se que uma alocação a hedge funds selecionados com base em modelos teria aumentando significativamente a performance ponderada ao risco face ao portfolio 50-50 ações/obrigações em 1997-2007, mas não teria trazido benefícios no subperíodo 2008-2016.
Por fim, o estudo procura encontrar as explicações mais prováveis para a deterioração no desempenho dos hedge funds e quais as implicações para o investimento futuro nesta classe.
A primeira hipótese colocada assenta na possibilidade de a intervenção histórica dos Bancos Centrais ter provocado um aumento das correlações e a redução de volatilidade dos ativos. A atuação dos Bancos Centrais, a seguir à crise financeira de 2008, poderá ter criado distorções nos mercados de ativos que tornaram mais difícil a implementação de muitas das estratégias implementadas pelos hedge funds, nomeadamente o longshort.
A este propósito, o gráfico abaixo ilustra as correlações entre ações e setores no mercado acionista dos EUA entre 1997-2016. No Painel A, pode observar-se a tracejado a média das correlações entre ações, a qual duplicou de 0,15 em 1997-2007 para 0,30 em 2008-2016. Já no Painel B também pode observar-se que a correlação média entre os 10 índices setoriais do S&P 500 passou de 0,54 em 1997-2007 para 0,69 em 2008-2016.
Outra hipótese avançada para a deterioração na performance relativa dos hedge funds prende-se com o aumento da regulação pós crise financeira, nomeadamente após a passagem do decreto Dodd Frank 2010 nos EUA (Dodd Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act). O maior escrutínio regulatório poderá ter provocado um aumento nos custos de compliance e ter comprometido os resultados de alguma atividade de trading dos hedge funds.
Em terceiro lugar, colocou-se a hipótese de retornos decrescentes à escala, já avançada por Aragon, Liang e Park (2014), bem como o efeito da divulgação de research descritivo das estratégias mais bem sucedidas de hedge funds, provocando o seu seguimento por mais intervenientes no mercado, porventura esgotando as oportunidades de geração de alfa.
De forma a avaliar a validade da hipótese de retornos decrescentes à escala, o estudo testou se a performance relativa dos hedge funds incluídos na amostra diminui com o aumento dos montantes sob gestão na classe. Tal como pode observar-se na tabela abaixo, o coeficiente de regressão encontrado foi negativo e significativo, cerca de -0,28, indicando que para cada aumento de 1% na dimensão da indústria, o alfa mensal do fundo médio diminuiu 28bp. Assim sendo, o estudo parece validar a existência de retornos decrescentes à escala na indústria de hedge funds, algo que pode ser uma explicação parcial para a sua underperformance no período.
Por forma a ser válida, a explicação assente nos efeitos da intervenção dos Bancos Centrais deverá implicar que a deterioração no desempenho relativo dos hedge funds tenha tido início após 25 de novembro de 2008, quando o Fed anunciou a primeira ronda de QE, e seja transversal a todos os modelos de seleção. Seguindo a mesma lógica, a explicação relacionada com o maior escrutínio regulatório deverá implicar que a underperformance dos hedge funds tenha tido início pouco tempo após o decreto Dodd-Frank, em 21 de julho de 2010, e seja também comum a todos os modelos. Por último, a hipótese da publicação das estratégias seguidas pelos hedge funds ter prejudicado o seu desempenho implica que a underperformance de um dado modelo tenha início após a sua divulgação em estudos académicos publicados.
Para avaliar as hipóteses acima descritas, o estudo determinou para cada modelo qual a data chave que divide a amostra em dois subperíodos de performance distinta. O encontro de uma data comum a vários modelos no final de 2008, sustentaria a hipótese da intervenção dos Bancos Centrais. Caso a data comum ocorresse após meados de 2010 tal sustentaria a hipótese do aumento da regulação. Já a deteção de datas que variem consoante os modelos e coincidam com datas de publicação de research das estratégias em causa, sustentaria a última hipótese.
Tal como se pode observar no gráfico acima, o ponto de viragem na performance encontrado em 5 dos 7 modelos corresponde ao início de 2008. Já os outros 2 modelos apresentaram como data de viragem de performance maio de 2011. Assim sendo, a análise dá suporte às explicações relacionadas com a intervenção dos Bancos Centrais e com o maior aperto regulatório, mas não encontra evidência sobre o efeito da publicação das estratégias seguidas.
Em jeito de conclusão, na medida em que os efeitos acima referidos, nomeadamente a atuação dos Bancos Centrais e a maior regulação, possam persistir no tempo, os hedge funds poderão não ter mais dificuldades em voltar a alcançar o mesmo nível de sucesso que justificou a sua ascensão, entre meados de 1990s e 2007. No entanto, o estudo também mostra que os hedge funds poderão constituir uma fonte viável de diversificação e, como tal, os investidores mais avessos ao risco poderão continuar a justificar uma alocação modesta a esta classe alternativa para seu benefício, via diversificação.