Weekly Note
Evolução económica recente no Reino Unido
Análise aos principais indicadores divulgados
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No terceiro trimestre deste ano, o PIB no Reino Unido cresceu 1,3% em cadeia, o que corresponde a um abrandamento face à taxa de crescimento de 5,5% registada no segundo trimestre. Desta forma, o PIB ficou 2,1% abaixo do nível do 4T19, um gap superior ao registado pelas restantes economias de relevo. Para a mesma data, o PIB dos EUA já se encontrava 1,4% acima do máximo pré-Covid-19, enquanto França, Itália e Alemanha apresentavam menores desvios negativos de 0,1%, 1,4% e 1,5%, respetivamente.
No terceiro trimestre, o PIB do RU ficou 2,1% abaixo do nível pré-pandemia
Pela negativa, destaca-se a evolução relativa do consumo das famílias. No terceiro trimestre deste ano, a despesa real das famílias no Reino Unido encontrava-se ainda 4,4% abaixo do nível do 4T19. No entanto, no segundo trimestre, o rendimento real disponível estava apenas 0,8% abaixo do 4T19, tendo previsivelmente crescido durante o decorrer do terceiro trimestre. Desta forma, as famílias permanecem cautelosas nos seus gastos, o que também poderá estar relacionado com a elevada transmissão do vírus no país.
No terceiro trimestre do ano, o volume de bens e serviços exportados diminuiu 1,9% em cadeia, situando-se 17% abaixo do valor médio em 2019. Tal como se pode observar no gráfico abaixo, no terceiro trimestre as exportações dos restantes países do G7 já estavam mais próximas dos níveis pré-pandemia, o que parece indiciar que o Brexit pode ter provocado uma perda de quota no comércio global, em 2021, para os produtores britânicos.
No final de setembro, o volume de bens e serviços exportados pelo RU situava-se 17% abaixo do valor médio de 2019
Já o investimento registou um aumento em cadeia de 0,4% no terceiro trimestre, ficando 12,4% abaixo do valor do 4T19. Apesar desta evolução, os balanços das empresas parecem relativamente saudáveis e os inquéritos às intenções de investimento situam-se em níveis elevados. Desta forma, a fraqueza do capex poderá refletir apenas o desfasamento temporal entre a melhoria de sentimento nas empresas e a finalização dos seus projetos de investimento, bem como algum travão proveniente de bloqueios ao nível das cadeias de abastecimento. Será expectável que a rubrica de investimento possa recuperar nos próximos trimestres, regressando ao nível pré-pandemia no decorrer do 2S22.
Nos próximos meses, o crescimento do consumo deverá continuar sob pressão devido ao efeito da subida da inflação nos rendimentos reais das famílias e à retirada dos apoios estatais. Assim sendo, o crescimento do PIB poderá abrandar novamente no quarto trimestre deste ano. Para 2021 como um todo, o FMI estima que a economia britânica possa crescer 7,0%. Já para 2022 o FMI antecipa uma expansão económica de 4,8%, com a superação dos níveis do 4T19 algures no segundo trimestre do próximo ano.
No que respeita à evolução da pandemia, importa referir que a média de 7 dias de novas infeções registou uma melhoria nas últimas semanas, situando-se em 38,4 mil casos à data de 17 de novembro, 18,6% abaixo do máximo registado em outubro. No entanto, esta evolução prende-se sobretudo com o período de férias escolares que provocou uma queda das infeções nas crianças em idade escolar.
Nos próximos meses será expectável que as infeções voltem a subir até porque a descida das temperaturas e a maior frequência em espaços fechados deverão contribuir para o aumento da transmissão viral. Por outro lado, a proteção da vacina para os menores de 50 anos também deverá diminuir ao longo do tempo. O atual ritmo ao qual está a ser implementado o reforço da terceira dose é para já reduzido, o que significa que as hospitalizações também poderão voltar a subir.
O ritmo da terceira dose da vacina é para já reduzido
Nos próximos meses, poder-se-á assistir a um aumento do teletrabalho, eventualmente prejudicando a evolução do output de serviços em geral e a utilização de transportes em particular. O elevado número de infeções poderá manter cautelosas algumas famílias, o que também poderá pesar na despesa em serviços e no desempenho da economia em geral no quarto trimestre do ano.
Em outubro, as vendas a retalho registaram um crescimento anual de 1,3% versus 0,6% em setembro. No entanto, a melhoria parece ter sido devida à antecipação das compras de Natal após os retalhistas terem alertado para a falta de stocks. Em outubro, o destaque positivo foi para a evolução das vendas não alimentares, especialmente a componente de vestuário. Pela negativa, as vendas de alimentos cujo crescimento em base anual diminuiu para 1,5% versus 2,3% em setembro.
Em setembro, os ativos financeiros líquidos totais das famílias aumentaram 9,4 mil milhões de libras, cerca do dobro do aumento médio de 4,8 mil milhões de libras registado nos dois anos anteriores à pandemia. Deste modo, o “excesso de poupança” das famílias britânicas – isto é, o extra que pouparam desde o início da pandemia acima da anterior média de 4,8 mil milhões de libras por mês – atingiu 187 mil milhões de libras atualmente, equivalente a 8,7% do PIB de 2020.
Em setembro, as famílias continuaram a poupar acima da média anterior à pandemia
Em setembro, as famílias também mostraram relutância em pedir emprestado, já que o crédito ao consumo bruto caiu 0,8% face ao mês anterior, situando-se 5,6% abaixo da média de 2019. As famílias parecem antes focadas em reembolsar as suas dívidas sempre que possível. Em setembro, os reembolsos de cartões de crédito permaneceram em níveis extremamente elevados. As famílias também optaram por reembolsar crédito à habitação, com as amortizações opcionais a atingirem 1,8 mil milhões de libras em setembro, acima da média de 1,5 mil milhões de libras nos dois anos anteriores à pandemia.
Apesar de algumas medidas favoráveis às famílias inscritas no Orçamento de Estado para 2022, tais como a subida de 6,6% no National Living Wage ou a retirada do congelamento dos salários dos funcionários públicos, o aumento dos impostos e das contribuições para a Segurança Social deverão prejudicar os rendimentos no próximo ano. Para além disso, o rendimento real das famílias será negativamente afetado pela subida da inflação. Em 2022, o rendimento real disponível das famílias poderá recuar cerca de 0,5%, a maior queda verificada desde 2011, trazendo incerteza para o outlook do consumo.
O rendimento real das famílias poderá recuar com o aumento dos impostos e da inflação
Certamente que, tal como já referimos atrás, o stock de poupança das famílias encontra-se em níveis extremamente elevados e como tal o recuo dos rendimentos reais pode não significar um prejuízo direto à evolução do consumo. No entanto, a confiança do consumidor diminuiu fortemente nos últimos dois meses e a provável subida das infeções no Inverno poderá ser um fator negativo adicional. Deste modo, o crescimento do consumo em cadeia poderá abrandar para cerca de 1,5% no quarto trimestre deste ano e possivelmente para 1,0% no primeiro trimestre de 2022 versus 3,0% no terceiro trimestre de 2021.
As famílias parecem continuar cautelosas e a confiança do consumidor diminuiu nos últimos dois meses
Em outubro, o PMI Compósito no Reino Unido subiu para 57,8 versus 54,9 em setembro, acima da estimativa de consensus de 56,8. O PMI Serviços subiu para 59,1 em outubro versus 55,4 em setembro, acima do consensus de 58,0.
Para o mesmo mês, o PMI Serviços atingiu um máximo de três meses devido à retirada total das restrições em julho e à sua flexibilização na generalidade dos outros países. A componente de novas encomendas aumentou para 58,4 versus 54,8 em setembro, atingindo um máximo desde junho. A aceleração na procura permitiu às empresas subirem os preços, com o índice de preços deste indicador a atingir 62,0 em outubro versus 61,6 em setembro. De qualquer forma, a evolução de preços também já deverá ter refletido a subida do IVA no setor de turismo de 5% para 12,5%. Já a componente de emprego aumentou para 58,6 versus 57,4 em setembro. No entanto, algumas empresas poderão estar a reportar aumentos de emprego embora estejam simplesmente a receber de volta os trabalhadores que se encontravam em layoff. O inquérito também não esclarece se os anteriores trabalhadores em layoff estão a regressar a tempo inteiro ou parcial.
Em outubro, o PMI compósito no Reino Unido subiu para 57,8 versus 54,9 em setembro
Em outubro, o PMI Manufatura subiu para 57,8 versus 57,1 em setembro, ligeiramente acima do consensus de 57,7. No entanto, para já não parece haver sinais de melhoria ao nível da disrupção das cadeias de abastecimento. O índice de timings de entrega de fornecedores diminuiu para 18,3 em outubro versus 19,3 em setembro, sinalizando uma deterioração dos bloqueios logísticos. A componente de novas encomendas recuperou para 53,7 em outubro versus 53,5 em setembro, porém permaneceu bem abaixo da média de 61,0 nos últimos seis meses, indiciando que o ciclo de reposição de stocks está a terminar e que os consumidores podem estar a retrair-se perante preços muito elevados. A componente de encomendas para exportação permaneceu ligeiramente abaixo de 50 pelo segundo mês consecutivo e ficou abaixo do indicador equivalente para a Zona Euro pelo décimo mês consecutivo. Ainda assim, nos próximos meses, mesmo que a procura abrande, a manufatura deverá manter-se suportada devido à acumulação da carteira de encomendas nos últimos seis meses. Será então expectável que, nos próximos seis meses, o output da manufatura se situe em cerca de 2% abaixo do nível de janeiro de 2020.
No terceiro trimestre, o total de volumes de exportação diminuiu 1,9% em cadeia, revertendo parcialmente a subida de 6,2% registada no segundo trimestre. Assim sendo, as exportações ficaram 14% abaixo do nível médio de 2018, considerado o último ano normalizado antes da distorção causada pelo Brexit em 2019 e os efeitos da pandemia em 2020. Já as importações registaram uma recuperação devido ao aumento da procura de combustíveis. Assim sendo, o défice comercial aumentou para 8,6 mil milhões de libras no terceiro trimestre versus 2,1 mil milhões de libras no trimestre anterior, situando-se acima da média de 6,7 mil milhões de libras registada durante 2015-2019.
A fraqueza sentida ao nível das exportações é devida em parte ao efeito negativo da pandemia sobre as exportações de serviços, nomeadamente no turismo. No entanto, tal como pode ser observado no gráfico seguinte, as exportações de bens também estão 13% abaixo do nível de setembro de 2018, apesar de terem aumentado para 26,0 mil milhões de libras versus 25,7 mil milhões de libras em agosto.
No terceiro trimestre, as exportações ficaram 14% abaixo do valor médio de 2018
A underperformance relativa do Reino Unido em matéria de exportações no terceiro trimestre parece sugerir o prejuízo causado pelo Brexit, para além da disrupção das cadeias de abastecimento que tem afetado todos os mercados em geral. No terceiro trimestre, o gap do valor das exportações face aos níveis pré pandemia no Reino Unido era o mais elevado entre as economias do G7, indiciando perda de quota de mercado por parte dos exportadores britânicos.
O diferencial das exportações, face aos níveis pré-pandemia, era mais elevado no Reino Unido do que nas restantes economias do G7 (3T21)
Nos próximos meses, não será expectável uma recuperação das exportações no Reino Unido. Os inquéritos mais recentes apontam para fraqueza durante o quarto trimestre. Como já foi referido acima, em outubro, o indicador de encomendas de exportação associado ao PMI Manufatura ficou abaixo de 50 e abaixo do índice equivalente para a Zona Euro pelo décimo mês consecutivo. De relembrar também que ainda existem riscos associados às disputas comerciais entre Reino Unido e UE por causa da situação especial da Irlanda do Norte.
Em termos do mercado laboral, importa referir os dados payroll preliminares divulgados para outubro, que mostraram um aumento de 0,6% no número de trabalhadores face ao mês anterior, situando-se agora 0,8% acima do nível de fevereiro de 2020. O indicador sugere que o desemprego não terá aumentado na sequência do fim do programa de layoff, já que os trabalhadores em dispensa sempre foram contabilizados como empregues e como tal estamos perante uma genuína criação de emprego. Porém, embora a maioria dos 1,1 milhões de trabalhadores (4% da força de trabalho total) que ainda estavam sob alguma forma de layoff no final de setembro ter aparentemente regressado ao seu anterior emprego, os dados não permitem inferir se o regresso foi efetuado a tempo inteiro ou parcial.
Os dados do mercado laboral de outubro parecem indicar que a maioria das pessoas que estiveram ao abrigo do layoff regressaram aos seus postos de trabalho
Em outubro, a taxa de inflação subiu para 4,2% versus 3,1% em setembro, atingindo o valor mais elevado desde dezembro de 2011 e superando a estimativa de 3,9% do Banco de Inglaterra. A subida da inflação ficou devida sobretudo ao aumento dos preços da energia, com o contributo dos preços do gás e eletricidade a aumentar para 0,7 pontos percentuais em outubro versus 0,1 pontos percentuais em setembro. Para além disso, os preços dos combustíveis avançaram 3,0% face ao mês anterior enquanto a inflação alimentar atingiu 1,2% versus 0,8% em setembro. No entanto, a principal surpresa adveio do aumento da inflação Core, a qual passou de 2,9% em setembro para 3,4% em outubro. A subida da inflação Core foi devida em parte a um aumento adicional na taxa de inflação dos automóveis usados para 22,8% versus 19,2% em setembro, resultado da escassez de automóveis novos. A inflação dos serviços de catering passou de 3,9% para 4,9% enquanto a inflação dos serviços de alojamento avançou para 12,3% versus 10,5% no mês anterior, com as empresas presentes neste setor a passar para os clientes uma parte da subida do IVA de 5% para 12,5%. A inflação dos serviços de educação também aumentou para 4,5% versus 2,9% em setembro, refletindo a subida das propinas para os estudantes da UE no seguimento do Brexit.
Nos próximos meses, será expectável a continuação da subida da taxa de inflação. O avanço nos setores de turismo e educação deverá prolongar-se e a inflação alimentar também tem espaço para subidas adicionais. Dados referentes à primeira metade do mês de novembro apontam para um aumento da inflação dos combustíveis. Por outro lado, a subida do imposto sobre o tabaco e a previsível subida dos preços do vestuário, face ao período de confinamento do ano anterior, deverão continuar a sustentar a inflação.
No passado dia 4 de novembro, o Banco de Inglaterra decidiu manter a taxa de juro inalterada em 0,10%. O Comité de Política Monetária votou por maioria – sete contra dois – deixar as taxas inalteradas, optando por aguardar por mais dados do mercado laboral. Na véspera da próxima reunião de política monetária, a ter lugar a 16 de dezembro, o Comité já terá em sua posse os indicadores finais que contemplam a evolução do mercado de trabalho após o fim do programa de layoff. Caso os dados venham em linha com o esperado, o Comité considera que será necessário nos próximos meses aumentar as taxas de juro por forma a trazer a inflação para o objetivo de 2% de forma sustentada. O Banco de Inglaterra afirmou que o PIB estará 0,75% acima do seu nível sustentável daqui a três anos caso as taxas de juro permaneçam inalteradas em 0,10%, sinalizando assim a necessidade de subidas de juros.
Após os dados de inflação de outubro, considera-se que a probabilidade de subida de taxas de juro na próxima reunião de dezembro é elevada. Possivelmente os indicadores finais do mercado laboral poderão até revelar um aumento considerável no trabalho a tempo parcial e as novas infeções Covid-19 poderão aumentar para níveis que comprometam a despesa futura das famílias. No entanto, com a taxa de inflação a situar-se em mais do dobro do objetivo de 2%, o Banco de Inglaterra poderá arriscar a sua credibilidade junto do público e dos mercados se optar por não atuar em dezembro.
Em suma, o crescimento do PIB no Reino Unido poderá abrandar novamente nos próximos meses. A evolução do consumo deverá continuar pressionada devido ao efeito da subida da inflação nos rendimentos reais das famílias e ao potencial agravamento da pandemia nos próximos meses. Os mais recentes indicadores também parecem sugerir a continuação da fraqueza ao nível das exportações líquidas. A subida acentuada da taxa de inflação para 4,2% em outubro tornou mais provável a subida das taxas de juro já na próxima reunião de política monetária em dezembro.